quarta-feira, 25 de dezembro de 2019

Boas-Festas e bom Ano Novo 2020

Boas-Festas e feliz 2020


  • Giotto  (1295-99) - Basílica Superior de São Francisco de Assis


sábado, 14 de dezembro de 2019

Comenda de São Cipriano de ANGUEIRA (1515)

Angueira -  Comenda nova (1515) 

da Ordem de Cristo (Tomar )

Quando a idade da inocência ditava as suas regras,  não havia pausas para reflexão. A liberdade de movimentos requeria-se total, apenas enquadrada pelas regras rígidas vigentes  para a garotada nos anos distantes do pós-guerra, dos anos cinquenta do século passado. Os retratos das figurinhas do Estado Novo impunham-se, pelas vibrações desmedidas da régua flexível aplicada com vigor ao estudante básico mal comportado, avaliado pela norma vigente de então. Agruras da vida da ainda imberbe rapaziada, que os períodos festivos acabariam por fazer esquecer.

Havia, como não, os anjinhos puros, de asas brancas, que se passeavam pelas procissões rituais, tentando-se conjugar a vida do aquém e do além. Os mais voltados para a vida terrena, eram simples figurantes de procissões com a dignidade imposta pelo conceito de cruzada, transportando a cruz simbólica de cruzado da Ordem de Cristo, com sede na cidade de Tomar.
Fig.1 - Cruz da Ordem de Cristo

Esta Ordem de Cristo foi criada em Portugal a pedido de Dom Diniz ao Papa Clemente V, após uma vitória diplomática relevante para a tomada de posse dos bens pertencentes à extinta Ordem dos Templários. Ver a propósito o video RTP 2, sobre a Ordem de Cristo. Clique aqui: [Ordem de Cristo - Tomar ] .

As comendas novas surgem em Portugal, após a vitória diplomática inicial de D. Dinis com  o Papado, conseguindo transformar a antiga Ordem dos Cavaleiros Templários sediados em Portugal numa nova ordem: A ordem de Cristo.


 Não se refere aqui, a primitiva  Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo e do Templo de Salomão,Cavaleiros Templários da Ordem do Templo, ou ainda simplesmente Templários. Foi uma ordem militar de Cavalariacriada para protecção dos peregrinos europeus até à Cidade Santa de Jerusalém. Os estatutos da Ordem foram redigidos por São Bernardo de Claraval. As regras monásticas iriam ser seguidas pelos Cavaleiros Templários. Acontece que o pai de Afonso Henriques era primo de São Bernardo e, portanto, o parentesco com a influente figura de São Bernardo junto do Papado iria estabelecer uma sadia convivência entre os Templários e o início do reinado de Afonso Henriques, em Portugal, em flagrante contraste com a França.

Esta Ordem dos Templários tinha duas componentes: a religiosa e a militar. [Nas imediações de Angueira, a vila de Alcaniças , foi durante a Idade Média uma vila fortificada que pertenceu aos Templários , de que apenas resta a torre do Relógio]. Não esquecer também que Angueira dependeu do Mosteiro Cistercience de Moreruela. A vila fronteiriça de Alcaniças, registou um acontecimento histórico importante -Tratado de Alcaniças- firmado a 12 de Setembro de 1297 entre os reinos de Portugal e Castela. Na Península Ibérica, os Templários desempenharam o papel de combate ao invasor muçulmano, protecção dos territórios cristãos e preciosos auxiliares da conquista de território.
1 Charola do Convento de Cristo IMG 9454.jpg
Fig.2 - Charola do Convento de Cristo

A Ordem do Templo chegou ao 
Condado Portucalense ainda à época de Dona Teresa que lhe fez a doação da vila de Fonte Arcada (1126) e a doação do Castelo de Soure (1127), na linha limítrofe de separação dos territórios cristão e muçulmano, sob o compromisso de colaborar na conquista de terras aos muçulmanos. No reinado de Dom Afonso Henriques (1143-1185), a ordem dos Templários recebeu a doação do Castelo de Longroiva (1145). Pouco depois os cavaleiros da Ordem apoiaram o soberano na conquista de Santarém (1147) ficando sob responsabilidade da Ordem a defesa do território entre o rio Mondego e o rio Tejo, a montante de Santarém. A partir de 1160, a ordem estabeleceu a sua sede no país, em TomarDesde o início da nacionalidade portuguesa existiu uma estreita colaboração entre a monarquia e os Templários, permitindo a solidificação e conquista do território português. Gualdim Pais, mestre da Ordem, combatente templário na Palestina, ficou encarregado da construção do castelo de Tomar e de Almourol, para protecção da linha do Tejo contra o invasor muçulmano. A Charola de Tomar reflecte a ideia da arquitectura da  Basílica do Santo Sepulcro.


O processo de extinção da Ordem no país iniciou-se com a recepção da bula "Regnans in coelis", datada de 12 de Agosto de 1308, através da qual o papa Clemente V deu conhecimento aos monarcas cristãos do processo movido contra os seus membros. Em França, Filipe IV, o Belo (1307) levou à prisão a maioria dos Templários e levou a cabo uma política de enegrecimento da Ordem junto do Papado. Após várias peripécias e conflitos, Jacques de Molay, último grão-mestre da Ordem, foi  queimado numa ilha da cidade de Paris, em 13 de Julho de 1314. A Ordem dos Templários acabou por ser extinta pelo Papa Clemente V  em 1312.  Sobre os Templários caiu a acusação  de vários crimes de negação de Cristo, de práticas de iniciação pouco edificantes, de sodomia e de heresia. Os processos de julgamento não conduziram a provas suficientemente sólidas para acusação e condenação. Os processos dos Templários continuam ainda  hoje envolvidos em mistério, com abordagens nebulosas mesmo nos tempos actuais, adensando o mito do desaparecimento rápido, duma organização sólida e economicamente muito poderosa. 

Posteriormente, pela bula "Callidi serpentis vigil", datada de Dezembro de 1310, o pontífice decretou a detenção dos mesmos, mas não a sua condenação.



Em França, Filipe IV perseguiu e  prendeu a maioria dos Templários, culminando com a condenação à morte pela fogueira do seu grão-mestre. O rei Dom Dinis (1279-1325), a partir de 1310 procurou evitar a transferência do património da ordem templária no país para a Ordem dos Hospitalários  defendida pelo Papa, vindo a acabar por obter do Papa João XXII a bula "Ad ae exquibus", expedida em 15 de março de 1319. Por esta bula foi aprovada a constituição da "Ordo Militiae Jesu Christi" (Ordem da Milícia de Jesus Cristo, ou Ordem de Cristo ), à qual foram atribuídos os bens da extinta ordem dos Templários, contrariamente ao estipulado pelo Papa Clemente V (1312). A nova Ordem de Cristo,  após uma curta passagem por Castro Marim, com base na protecção e prevenção dos ataques de muçulmanos ao Algarve, veio a sediar-se, definitivamente, na cidade de Tomar em 1357. Em 1417, Dom João I ,obteve da Santa Sé, a nomeação do príncipe Dom Henrique para seu governador e regedor, e em 1421, pela mão do Infante, dá-se início à dinamização da Ordem de Cristo, modificando a regra de Cister para a de Calatrava, mantendo ainda a sua componente militar e religiosa. A sua visão estratégica conduziu Portugal ao seu zénite, respeitado e admirado por todos os povos europeus : Época das descobertas e expansão do Cristianismo pelas várias partes do globo.



A clarividência e a bem conseguida diplomacia junto do Papado, acabou por fazer reverter os bens dos Templários para a nova ordem de Cristo, e ainda forçando a Ordem de Cristo à autoridade régia. Inicialmente, a Regra da Ordem dos Templários obedecia espiritualmente à ordem de Cister (Mosteiro de Alcobaça), sendo modificada para a de Calatrava em 1421, como referido.

A Ordem do Templo durou cerca de duzentos anos ( 1118-1312), dependendo directamente do Papado e só respondendo perante ele.
Fig.2 - Actual Convento de Cristo (da Ordem dos Templários e  da Ordem de Cristo)
2. As regras e definições da Ordem de Cristo, foram encomendadas a Fr. Pedro Álvares Seco, compiladas em " Livro da Regra e Definições da Ordem de Cristo ". 


3. Os Templários, Bárbara Frale, Edições 70 Lda, (2007)



As comendas novas  de  D. Manuel - Rei e Mestre, entre elas a de Angueira e Palaçoulo, foram criadas na sequência de uma bula do Papa Leão X que permitia que uma renda anual revertesse a favor da Ordem de Cristo"

As regras dos Templários foram, então, veiculadas pelas faixas de cruzado, manualmente colocadas no pequeno figurante, nestes rituais de procissões, paredes meias com o rito pagão? A cruz que se transportava era apelativa e, que conste, todos caminhavam com garbo com tal distinção pelas ruas lodosas desta pobre aldeia, nos confins do mundo. 

Impunha-se a cruz  à rapaziada irrequieta e atrevida, numa faixa de linho, alva de neve, mas não se explicava a causa de tal tradição. Aparte a cruz, de geometria e significado preciso neste caso (Fig.1) , nada mais fazia desvendar um mundo de religiosidade extrema, conquista e aventura, saber e o trago amargo da morte dos Cavaleiros Templários.  Acontece que nunca há bela sem senão e nada acontece por acaso ou simples capricho dos deuses. Desta memória difusa, resta uma agradável lembrança e recordação.

A habilidade diplomática de D. Dinis fez com que se procedesse à transferência  dos bens templários para a nova Ordem de Cristo. Por posição conjunta de D. Dinis e Fernando VI de Castela, conseguiu-se que os bens dos Templários na Península Ibérica não fossem transferidos para a Ordem dos Hospitalários, como o Papado pretendia. Posteriormente, as ordens militares dos reinos ibéricos seguiram os seus próprios caminhos. Naturalmente, foram evoluindo com os tempos. O seu desenvolvimento é, por vezes atribulado, mas constitui uma matéria aliciante de estudo. Este texto, não é mais que um aliciante para o estudo dos Templários, ordens religioso-militares, o alcance do seu pensamento e a singela conclusão que nada surge por acaso.

As procissões, com crianças com faixa de cruzado, relembrando as cruzadas de outrora eram comuns à época e, portanto, não eram obviamente exclusividade de Angueira. Não há registo de fotografias locais do nosso conhecimento [ ou de quem as possa disponibilizar]. 

Porém, esta pequena localidade tem a sua história vinculada à criação das Comendas Novas da Ordem de Cristo do Séc. XVI, levadas a cabo por Dom Manuel.  No texto original refere-se :

"Ex ecclesia autem Sancti Michaelis de Angueira et Pallacoilo cum suis annexis in termino de Miranda de Doyro illius comendatario viginti octo et rectori sesaginta. "

1.  [As Comendas Novas da Ordem de Cristo. Século XV, de  Isabel L. Morgado de Sousa e Silva - Porto, 2012 - Militarium Ordinum Analecta, Vol. 13, pg.46 e 270] .


A bula "Redemptor noster" de Leão X, concedendo a D. Manuel I rendas eclesiásticas até ao montante de 20.000 cruzados para a dotação de comendas na Ordem de Cristo.

Para os interessados, V. referências 1 e 2 , para a implementação detalhada desta medida. 

As somas que reverteram para a Ordem de Cristo destinavam-se ao financiamento das empresas bélicas em  África, à expansão marítima e à evangelização das terras descobertas. Assim a história de uma pequena aldeia se cruza com os grandes desígnios de um povo e um pequeno contributo pode contribuir para grandes realizações. 

As sociedades são dinâmicas e os conceitos vão variando com os tempos. As intolerâncias religiosas também. Desde mudam-se os tempos, mudam-se as vontades dizia, Camões até ao refrão da actualidade: o mundo é composto de mudança. 

Existe um processo judicial, narrado no Jornal do Nordeste, onde se refere um acontecimento trágico da Rua da Costanilha  - Miranda do Douro, envolvendo um rendeiro desta comenda de São Cipriano de Angueira. 

"Para além disso, Francisco Rodrigues também era rendeiro, trazendo arrendada, ao “contador de Tomar” a comenda de S. Cipriano de Angueira, que era da Ordem de Cristo. E emprestava dinheiro, como se depreende dos objetos de ouro e prata que tinha em seu poder, empenhados." 

Clique aqui: Contador de Tomar . 

É sina do mundo de hoje ficar dependente de políticos, que por narcisismo projectam a sua fraca figura por cima de tudo e de todos.  Com base no mundo cósmico, de acordo com um certo político, [é só fazer as contas], para verificar o nível da sua insignificância. Quem sou eu, quem és tu? Há cerca de 200 mil milhões de galáxias. A nossa pequena nave (Terra) gravita em torno do Sol, fazendo parte duma pequena galáxia, na periferia da Via Láctea, constituída por 100 milhões de estrelas [Universo conhecido]. A nossa pequena nave serve de abrigo a cerca de  cerca de 7,5 mil milhões de seres humanos, de entre uma população de seres vivos de vários milhões de espécies. A comparação pode ver-se através do video. Comparação das dimensões do Universo em 3D [Comparação das dimensões de objectos no Universo ].  Portanto, tudo é relativo. Neste período, não há nada mais gratificante que um insignificante passageiro da Terra possa observar e contemplar a obra magnífica do Universo visível, com as incertezas associadas  à nunca respondida pergunta de quem o criou.