quarta-feira, 16 de outubro de 2024

 Encontro fortuito - Pedra da Cruz

Numa das pequenas deambulações pela aldeia, mas de olho em rochas, observei uma pequena pedra - conhecida dos colecionadores como Pedra da Cruz. Já me tinha cruzado com esta pedra rara na literatura dos meios colecionadores. Surpresa total. Feito o preâmbulo, vamos à descrição sumária do achado.


Fig.1 - Pedra da Cruz (Quiastolite)

Exemplar de Pedra da Cruz, encontrada em Angueira.
A Pedra da Cruz está partida, faltando a parte correspondente ao ramo 4, sendo claramente visíveis os ramos 1,2 e 3. A rara Pedra da Cruz é etiquetada pelos colecionadores de cristais e lojas de venda como sendo uma pedra rara, com a particularidade de :

"Significado da Pedra da Cruz - A Pedra da Cruz combate maldições, mal olhado, magia negra e inveja, elimina desavenças no lar ou local de trabalho e reduz todos os medos.

 Esta pedra aumenta nossa fé e conexão com as forças da luz, facilita viagens astrais, ajuda a lembrar o propósito de nossa Alma." da Internet!

NOTA: O objectivo deste texto é claro e visa combater as crendices que por aqui e por ali circulam, sobretudo pelas feiras, onde se mistura crendice e conhecimento científico. Porém, esta rocha metamórfica tem percorrido várias sociedades e organizações desde povos antigos, passando pelos templários, até aos tempos actuais havendo um renascer do interesse da Pedra da Cruz ligado às energias do Chakra e de outras áreas. Uma delas é o seu efeito terapêutico. Assim, há vários livros que pretendem introduzir ideias e conceitos nesta base. Refere-se "A bíblia dos cristais, de Judy Hall com descrição de mais de 200 cristais.


Efeitos Terapêuticos da Pedra da Cruz

"Essa pedra dissipa ilusões e acalma o medo, ajuda a solucionar problemas, nos faz manter a fé no mundo espiritual durante doenças e traumas. Ela melhora o fluxo sanguíneo, alivia a acidez, cura gota e reumatismo e estimula a lactação em fase de amamentação. Sua energia também equilibra o sistema imunológico, ajuda a curar a paralisia, fortalecer os nervos e fortalece nosso poder de autocura de um modo geral." da Internet! Dada a potencialidade e riqueza  dos minérios brasileiros, é normal que muitos destes textos provenham do Brasil.

NOTA do autor: Quando houver problemas desta índole, consulte o seu médico sff! Isto é: fie-se na virgem e não corra!


Fig.2 -Pedra da Cruz (Imagem Internet)

Para os interessados, deixa-se aqui uma descrição genérica da QUIASTOLITE, não se limitando a uma simples descrição [Carregue aqui sff ] QUASTOLITE (em inglês). Este mineral é conhecido como "Quiastolite" e sob o nome comum de :"Pedra da Cruz" ou Cruz de" Andaluzite", com personalidade própria e carácter distintivo, que frequentemente apresenta uma cruz, no interior da sua estrutura. É uma variedade de "Andaluzite", faz parte dos silicatos de alumínio e tem como fórmula química neutral [Aluminio:Al, Si -silício e O- oxigénio " (Al2 Si O5)". Em geral, anda associado a vários outros elementos, sódio, potássio, ferro, magnésio . . . pelo que cada amostra tem diferente percentagem destes elementos. Do citado artigo (em inglês), trata-se de um mineral metamórfico, formado em enquadramento de metamorfismo regional, em áreas de contacto de granito e xisto, envolvendo altas temperaturas e pressões. Os processo geológicos precisos carecem de estudos aprofundados, mas a formação da  andaluzite anda associado a metamorfismo de rochas ricas em alumínio, como o xisto, surgindo muitas vezes em zonas vizinhas do granito (rochas ígneas).


Fig.3 - XRD (Diagrama R.X.) - Andalusite.




Fig. x. - Andalusite com Quartzo e Muscovite.


Em geral, a andalusite anda associada a vários cristais, entre eles o zircónio (Zi O4), que permite a datação das rochas.

Fig. 4 . - Andaluzite( com zircónio, e outros)

A especificidade da quiastolite e suas variantes assenta na composição química dos ramos da cruz. Em geral, os ramos apresentam cor negra, associada a impurezas de grafite. No caso da nossa amostra (Fig.2, a impureza não é negra (e ,portanto, não há grafite associada e, em contraste, é formada por um mineral que requer análise química para saber da sua composição. A origem do aparecimento da cruz não é totalmente clara e definitiva, sendo a teoria mais aceite a que resulta da fixação de impurezas nas faces da andaluzite neutra (Al2 siO4), durante o seu crescimento.

A prova cabal da amostra encontrada tem de passar por estudo aprofundado da mesma e, só então, haver conclusões seguras. Todavia, a Pedra da Cruz esteve em voga, durante os Sec. XVI e XVII, como prova da estadia dos peregrinos a Santiago de Compostela e proteção na sua viagem de regresso. Inicialmente, pensou-se que seria uma Pera apenas existent nas cercanias de Santiago. Posteriormente, muitas outras origens foram reveladas. Consulte sff. o artigo de  Miguel Calvo Rebollar,  [em De Re Metallica 26, 2016], onde se defende "The "lapis crucifer", "Piedra de cruz de Compostela" um elemento importante de los patrimónios geológico y cultural del NW de España.

A introdução da descrição desta pedra, levanta desde já um problema. Qual a história da pedra {Fig.1} encontrada em Angueira? É simplesmente uma pedra nativa (muito provável) ou e ,apenas, uma pedra usada por algum peregrino? Manifestamente, o saber não ocupa lugar e a humildade de reconhecer, que nem tudo é conhecido do homem, fazem parte da actividade humana. Apenas, os broncos dos políticos sabem tudo e são arrogantes até ao despudor sem limites, e pululam hoje em dia por aí como percevejos arrogantes.

Muitos outros consideram esta pedra como simples amuleto. Recordo os tempos de inocência, em que eu e quase todos os outros colegas da primária fazíamos uma figa ao ir para a escola, ao contornar uma certa esquina. Os tempos de hoje são diferentes e a idade não perdoa. Obriga-nos e temos o dever de ser responsáveis e sérios. E essas velhas  histórias de crendice e teorias de banha da cobra, não passam de historietas de opereta.