sábado, 22 de agosto de 2020

Pseudojornalismo e a desconhecida Pitunisa

 No jornal Público saiu uma reportagem sobre o pequeno burgo de Angueira. Qual Pitunisa, a Snra. Jornalista previu a aceleração da morte anunciada do burgo. Sem consultório conhecido, esta Pitunisa veio através de um texto manhoso, recorrer à Covid-19 para preencher duas páginas conseguindo um duplo objectivo: 

  • Revelar a superficialidade com que abordou o tema, metamorfoseando-se de Sra. Jornalista  em pseudojornalista de entretinamento para leitura fácil pela classe dos dolce fare niente, em época balnear. 
    • A superficialidade da sua abordagem ignora o declíneo de milhares de aldeias por todo o território, que o seu conterrâneo Afonso Henriques procurou libertar de apeias várias e os seus sucessores procuraram povoar.
  • Transformar um jornal, escrevinhando um texto,  digno de verdadeiro pasquim. 

Vamos aos factos.

A reportagem não visa a sobrevivência do pequeno burgo, mas tão somente alvejar, de modo claramente hostil, com uma conclusão antecipadamente assumida: a morte anunciada do burgo. Mas este posicionamento constitui, apenas um fundo decorativo para exaltação duma prosa obsoleta que só desclassifica quem a escreve. Descreve a jornalista o perfil de alguns naturais pelo critério insólito da indumentária, extrapolando sem nexo nem consistência intrínseca o propósito de denegrir, acirrar ânimos, para defesa da sua tese. Traduz factos pela terminologia de "resmungar". Há afirmações escritas pela jornalista que nunca foram pronunciadas por alguns intervenientes. Num dos"resmungos" foi-lhe claramente indicado que o problema da desertificação era um problema político, de abandono continuado quer por parte do governo central quer pelas autoridades administrativas locais: CMV e PJ e de contornos muito complexos.  O que esta região devia reclamar era a implantação de uma dúzia de fábricas de nível-Faurécia, e de modo indirecto e progressivo reavivar uma agricultura moribunda. 

Como a reportagem era encomendada, a fuga para a superficialidade atroz é evidente e, por ironia, a jornalista prenunciou a morte do jornal, através da escrita decadente duma jornalista dos seus quadros. Como certo discurso saía fora do guião, contornou o problema atirando com verbos à descrição do vocabulário da jornalista.

Se de uma jornalista, em principio de carreira se tratasse, não haveria lugar às perguntas seguintes Quem lhe paga o salário? Por acaso o jornal exige-lhe que desça ao nível de comadre de outrora? A Sonae.com nada lhe diz quanto à NOS? Quem deixa óbulos nos supermercados Continente? Não consegue vislumbrar que a população deste pequeno burgo protesta com zanga mansa  uma melhoria de vida? Duma verdadeira jornalista esperava-se compreensão, respeito e determinação para alcançar o objectivo fundamental de uma melhoria de vida desta população. A reportagem revela instintos primários de negação das causas  que conduzem o mundo rural ao progressivo e continuado apagamento. A reportagem não é mais que uma foto instantânea, que aliás não corresponde à verdade. baseando-se num negativismo permanente e afundamento do estado psicológico do deplorável status quo? Ignora uma célebre frase dum político americano: "Diz-me o que podes fazer pela América e não o que a América pode fazer por ti".  

Esta população é digna do maior respeito. Partiram, de mãos vazias, de casebres que honradamente reconstruíram com sangue, suor e lágrimas. E de mãos calejadas, fizeram obra em paredes tortuosas. Com histórias de vida, sofridas quase todas e muitas delas desconhecidas e não narradas, em tudo contrárias às vidas associadas aos detentores de projectos PIN, políticos e afins, à custa substancial de fundos europeus. A população, na sua maioria, ao que à imagem das casas diz respeito, nada deve aos fundos europeus.  A casa cor de rosa  não envergonha, dignifica quem a construiu e conseguiu inverter parte do destino traçado  entre emigrantes e imigrantes.

Enquanto ex-colaboradora da RTP, aconselho-lhe (tal como aos leitores deste texto), a vêr a entrevista de uma honorável senhora, de nascimento e matriz humilde segundo a própria, digna dos maiores elogios e respeito pela comunidade científica, nacional e internacional. Como é que uma jornalista pode divagar sobre personalidades, baseada em simples colares?

(https://www.rtp.pt/play/p6646/e488074/grande-entrevista,  onde poderá observar um colar de pérolas, que tanto ofende a jornalista). Em suma, o uso de colares, não passa senão de um devaneio da jornalista, tristemente humorístico, para preencher páginas de jornal, para lêr en passant. Até a apresentação dum figurante de suspensórios, desperta o raciocínio, perturbado e complexo da jornalista. Aqui se reproduz a definição:" 

Suspensórios; nome masculino plural : Fitas quepassando por cima dos ombrosseguram as calças pelos cósalças" _dicionário Priberam . 

Quanto aos Crocs brancas, deixa-se um texto em françês, apropriado para emigrantes franceses:

"La plupart des infirmières aiment porter des Crocs parce qu'il est léger et comme presque comme si vous ne portez pas de chaussures". 

Em conclusão, de uma situação banal, pretende fazer psicologia apressada para tentar justificar a sua tese, manifestamente de pitunisa, em modo adivinhatório, acintoso e viperino.

Ao enveredar por este caminho de sobranceria, pôs-se a jeito para um qualquer croc lhe poder fazer uma pergunta embaraçosa e que aqui não se faz, por escrúpulo e decoro. Voltemos agora aos mui dignos habitantes do pequeno burgo. A mente errática da jornalista força-a a usar uma quantidade de verbos, adjectivos e substantivos que num estúpido fluir, conduz a um turbilhão de asneiras continuadas e inverdades. Reproduzem-se algumas: "resmungar (dois contemplados); zanga mansa; pretensões senhoriais; quezília de casal velho". Manifestamente, não passa de uma ignorante primária, mas pretensiosa, com a qual não se vai perder tempo. Não entende nem compreende a vivência destas gentes.

Quanto aos verbos, reproduzo uma velha maneira de aprendizagem dos afortunados que foram à escola, onde figuram alguns entrevistados. Reproduzo:

"Vozes de animais 

Palram pega e papagaio
E cacareja a galinha;
Os ternos pombos arrulham ;
Geme a rola inocentinha.

Muge a vaca, berra o touro;
Grasna a rã, ruge o leão;
O gato mia; uiva o lobo,
Também uiva e ladra o cão.

Relincha o nobre cavalo;
Os elefantes dão urros ;
A tímida ovelha bale ;
Zurrar é próprio dos burros.

Regouga a sagaz raposa
(Bichinho muito matreiro);
Nos ramos cantam as aves;
Mas pia o mocho agoureiro.

Sabem as aves ligeiras
O seu canto variar;
Fazem gorjeio às vezes,
Às vezes põem-se a chilrar .

O pardal, daninho aos campos,
Não aprendeu a cantar;
Como os ratos e as doninhas
Apenas sabe chiar.

O negro corvo crucita ;
Zune o mosquito enfadonho;
A serpente no deserto
Solta assobio medonho.

Chia a lebre; grasna o pato;
Ouvem-se os porcos a grunhir ;
Libando o suco das ores,
Costuma a abelha zunir.

Bramem os tigres, as onças;
Pia , pia o pintainho;
Crucita e canta o galo;
Late e gane o cachorrinho.

A vitelinha dá berros ;
O cordeirinho, balidos ;
O macaquinho dá guinchos ;
A criancinha vagidos.

A fala foi dada ao Homem,
Rei de outros animais,
Nos versos lidos acima
Se encontram em pobre rima,
As vozes dos principais.

Pedro Dinis, Tesouro Poético da Infância, org. Antero de Quental, Publicações D. Quixote, 2003. "

Mas não bastava a prosa sobre indumentária, alargou a sua douta opinião sobre instrumentos normais de trabalho. À jornalista, faltava ainda a imagem dum ancinho. Outro pormenor, deveras interessante para a reportagem. O ancinho, por acaso, sabia que a imprensa é uma arma de dois gumes e apontou a casa histórica, com uma vetusta origem que aponta ao Séc.XIII, dando-lhe natural prioridade de  primazia na reportagem. Sinónimo da degradação continuada dum território [V.foto]. 
 

Fig.1 - Patamar de entrada de xisto (casa histórica, local)

Nada mais convincente do que ajudar, com verbas a fundo perdido, a reconstrução desta casa histórica.  Ou, pergunta-se, como surgiu o aldeamento de Angueira? Resposta, pelo repovoamento e fixação de habitantes, pela concessão perpétua das terras desbravadas. Pelo aproveitamento das margens férteis do rio, que o mosteiro de Moreruela domou com a construção de diques e a regularização das suas margens. Assim conseguiu sobreviver por cerca de 750-800 anos. Os tempos, agora, são compostos de mudança.

 Os projectos europeus morrem todos na capital da ruralidade. Há zanga mansa que não transparece. O aldeamento só morrerá se os naturais quiserem, permitirem ou consentirem. Com afrontamentos vários, com luta rija, continuada, sobreviverá contra ventos e marés, até que a justiça prevaleça. A reportagem ignora que há gente que vai à luta, não por ambições senhoriais, mas porque pensam e reflectem sobre a célebre frase de J. F. Kenedy. Não pelo padrão capitalista da ideia disseminada pela reportagem. Para ser claro, alguém referiu com plena consciência e lucidez que há certos investimentos que não compensam. Bem antes, pelo contrário.

 Todavia, constitui um acto de resistência contra o niilismo desenvolvido em toda a reportagem.  Colocar dinheiro, ganho com esforço, dispensado de carteira própria, é apenas compensado com uma certa satisfação pessoal para ressurgimento duma aldeia milenar. Há muitos e muitos exemplos. O número de casas reconstruídas no burgo é grande e outras mais se sucederão. A reportagem ignora de que têmpera é feita esta gente. Reflectida na construção das suas casas, com dinheiro próprio e, em certos casos, com as próprias mãos calejadas.

Possui a dureza dos seixos calcinados por fogo antigo, entrelaçada com rocha de xisto, mais mole. Se há outras aldeias com a designação de aldeias de xisto, este pequeno burgo de Angueira devia figurar como uma delas, com a particularidade de estar construída sobre rochedo contínuo de xisto, caso raro. A CMV está desatenta e a sua miopia não permite olhar para povos próximos. Andam distraídos, a ver passar comboios imaginários e casas de papel. Vimioso progrediu à custa da espoliação das aldeias vizinhas. Não é só o poder centralista lisboeta que é responsável. A teoria centralista de Vimioso conduziu e insiste no apagamento progressivo dos aldeamentos que a constituem. De efeitos mais pesados que a de Lisboa. A fixação da jornalista no aldeamento de Angueira não tem explicação (ou tem, e é claro !).


Fig.2. - Casa do adro.

A Pitunisa de Delfos também previa, sob encomenda. Nem sempre acertava. Em casos complicados recorria a sacerdotes, seus ajudantes. Se há local para desconfinamento perfeito, este pequeno lugar é um deles (entre muitos das proximidades). Pretender comparar um simples apartamento de 100 m2 para os felizardos do meio urbano é equivalente a pretender meter o Rossio na Betesga. Aqui, o desconfinamento é total (com cumprimento exemplar) de todas as regras da DGS. 

Falha a piscina,digna desse nome. Falta a mini-hídrica para garantir água límpida de reserva. para consumo doméstico, regadio e lazer. Há baldios para a implantação de painéis solares. Tal como o parente alentejano sobre o Alqueva: construam-na, porra! Realizem obra prática, para as populações. A ser verdade, a construção de um Multiusos em Caçarelhos, estamos perante uma monstruosidade perfeita. Resta às populações, todas, bloquear tal alarvidade. 

Porque não um parque infantil em Angueira? Porque não um circuito de manutenção física? Obras de tostões, em oposição a obras faraónicas. Gostaria de ser mosca para ter seguido o percurso até à conversa telefónica com a  representante da CMV. Não há PJ de permeio ? Questões banais para o Snr. Presidente da CMV? 

Dado que o texto já vai longo, em modo conclusivo: a reportagem não reflecte nada da situação real, o registo fotográfico é, como todos percebem, de carácter instantâneo. O ancinho, apanhado em momento e local improváveis, foi transposto desvirtuado para o texto. A população local não brinca aos ancinhos, lida com enxadas e enxadões a sério. Não faltaria arte para fotos banais, mas por ora não estou ainda a circular pelas delicias maravilhosas das cervejarias de Aveiro. Cerveja, cervejeiros e cervejarias há muitas. Onde é que eu já ouvi isto?  

Causou a Sra.Jornalista danos evidentes no pequeno burgo pelos ecos que vão chegando. Conclua-se que a fundamentação de toda a reportagem é na verdade formada a partir de nulidades, intriga permanente entre habitantes, irmão contra irmão, marido contra esposa, zanga mansa contra resmungo, acabando em adivinhação não sustentada. Por acaso a Sra. Jornalista não desconfia sequer que diálogos, cordatos, sinceros e continuados com muitos Antónios têm por base respeito mútuo de ideias. O seu ego perverso, não lhe permite descortinar o que está atrás da cortina. 

Reportagem horrenda, inócua e pré-concebida. Perder tempo com reportagens deste estilo, é pura perda de tempo. Todavia, os naturais percebem que não passa de mera opinião de uma jornalista, que pode ser contraditada, parágrafo a parágrafo, linha a linha, ponto por ponto,  se para tanto houvesse paciência. Mas que causa danos e obriga a reflectir sobre o poder do sistema e que futuro os naturais querem reservar para Angueira.

Para amenizar o texto, em tempo estival, aqui se deixam vários sítios onde poderá ver alguns vídeos, em várias línguas por onde os naturais de Angueira labutam pelo mundo, à procura de vida melhor que o próprio país lhes nega (Inglaterra, Austrália, França, Espanha, entre outros Brasis). Emigrantes, construtores de novos mundos, de lema simples: Antes partir, que torcer.

Se a Snra. Jornalista ignora factos: interrupção contínua de emissões de TV, inexistência de Internet, as causas fundamentais da emigração, conceitos de demografia (como sugere que domina) nada há a fazer. Assim permaneça por muitos e longos anos, na sua apagada e vil predestinação. Com mentalidades medievais, a conclusão é certeira.

Qualquer mente - nem precisa ser iluminada, lhe traça um retrato. Os mais ousados considera-la-iam como persona non grata. Mas desengane-se.  Desejam-lhe a melhor sorte do mundo. Cresça e apareça. Que, uma pequena casinha de xisto a seduza, levante-a, a pulso e dinheiro próprio, estabeleça-se em tele-trabalho, procure ajudar gente digna que a sorte nunca premiou. Verá a alma desta gente, com clareza e conhecimento de causa.

Em jeito de despedida, porque na sua concepção a Internet é objecto de maldição no burgo, deixa-se a voz áspera de Cohen  "Till the end of love", "Nathalie de J. Iglesias", "Bella Ciao de Chloé e porque não o citado Roberto Leal, para fim de festa.

Porque, na concepção da jornalista a INTERNET é abominável [mas cujas ferramentas usa profusamente] sugere-se que o processo até chegar aos videos, passe pela escrita. Indica-se a metodologia:

1. Com o Google (ou browser equivalente) escreva: " till the end of love leonard cohen "

  • Active o video
    • "Dance me to the end of love"
    • Várias versões
  • Repita o processo para os restantes.
Por ex.
  • " nathalie julio iglesias "
  • ou
  • Julio Iglesias - Nathalie
    • Há versões fogosas e picantes

  • Bella ciao Chloé Stafler
    • Canção de resistência - cantada por Jovem Francesa

2. O escritor Fernando Namora, entre outros, descreve dois mundos: rural e citadino.

O grande RIO TRISTE tem um parente pobre : o Rio Angueira. Rio pequeno, mas onde aparecem animais exóticos que a Snra. Jornalista referiu. A ciência e os naturais percepcionam como se pode lutar contra a sua destruição. O lagostim natural extingui-se por processo semelhante à COVID-19. As tencas abandonaram as suas águas. Pretende a Snra. Jornalista lutar pelo lado positivo da história, pelo renascimento de pequenos aldeamentos ou seguir teorias niilistas, sem esperança? Foi acima deixada uma sugestão. Levante do chão uma casinha abandonada,"bon marché ". O seu colega abonará: "bela aldeia".

 Os habitantes do pequeno burgo julgam pela experiência de vida, adquirida com corpos molestados pela dor. Respeito e humanidade. Há gente que não verga facilmente e essa gente, que a Snra. Jornalista acha a causadora do apagamento e culpada, é intocável, mesmo vindo de ataques vis e oportunistas. Leia, pacatamente, no conforto de uma lareira local. Tem à sua escolha uma imensidão de livros variados, de cariz humanitário muitos, pré-revolucionários - outros, de caracterização de sociedades muitos outros.

  Como facilmente se poderá concluir, a Snra. Jornalista tem direito à sua opinião. Sem falsos moralismos, todo e qualquer cidadão tem o direito à sua, mas não atire para um jornal adivinhações sem prova. A juventude, pelo trabalho, duro e  digno como os seus antepassados, terá também a sua parte no esforço. Creio que a francesinha Chloé, não tenho qualquer dúvida,  ao cantar Bella Ciao sabe o que isso significa. Não há progresso humano e material, sem luta e resistência.

 









 




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